sábado, 6 de setembro de 2014

BRASIL: OS PERIGOS DA DESPOLITIZAÇÃO EM TEMPOS DE HEGEMONIA E VICE-VERSA AO CONTRÁRIO (2)


 

Retomo um tema que abordei aqui no blog, partindo da premissa de que estamos vivendo no Brasil um processo de hegemonização do poder político, o qual  aposta na despolitização dos cidadãos para se consolidar, evitando questionamentos e tudo que possa colocar limites ao poder hegemônico. 

O melhor exemplo de tentativa de despolitização foi a estratégia lulista da bipolaridade: lula/pt x fhc/psdb e seu corolário, nós e eles, satanização x endeusamento. O cidadão manietado nessa camisa de força é facilmente manipulado e  desestimulado de pensar. Nada de debate de idéias, contraditório e pluralidade. 
Despolitização combina com maniqueísmo (o bem e o mal ou os bons e os maus). Essa estratégia de alguma forma diminuiu o valor de muitos acertos, avanços, conquistas sociais, políticas, econômicas...


No caso das eleições para a presidência da república, o processo de despolitização parecia estar se transformando em processo de politização. A candidatura de Marina exemplifica mas não explica completamente o fenômeno, que é mais profundo e ocorre na sociedade, que começa a se libertar da camisa de força da polaridade empobrecedora em que tentaram nos aprisionar. Há quem considere a campanha de Marina também despolitizada. O mesmo não se poderia dizer do processo eleitoral em curso.
O que ocorre é que o poder político hegemônico não suporta ser questionado. Podemos afirmar, com base na experiência e algumas leituras,  que a luta política ao se expressar claramente como luta política, provoca uma imediata resposta ou uma espécie de reação em cadeia, quase instintiva do poder e seu entorno, seus aliados, apoiadores. O poder produz o pensamento hegemônico  e a hegemonia se expressa, se manifesta, se reproduz. Pouco importa a honestidade intelectual.
 
No Brasil, aprendemos com a nossa experiência e com um pouco de estudo, essa diferença qualitativa da luta política:a luta pelo poder
Não é permitido questionar o poder. Se esta proibição for ignorada, haverá consequências. Esse aprendizado na luta democrática no Brasil,  nos custou caro.
Mas sempre houve uma vanguarda buscando esta luta política, este questionamento do poder.  Sempre houve essa tentativa de politização,  mesmo das lutas econômicas ou reivindicatórias. Essa era a diferença política entre a vanguarda e ‘as massas’ estudantis,  operárias, camponesas.  Ou entre vanguarda e a retaguarda nos movimentos sociais.


Quando penso em ‘despolitização’  a palavra aparece sempre entre aspas, por se tratar de algo aparentemente impensável, tal a amplitude dos significados de política e politização. 
 
O  processo conhecido na física como sublimação me dá uma ideia mais próxima do que acontece  com quem se despolitiza ou aceita conceitos despolitizados, embora lhe causem certo estranhamento, justamente por que não foi sempre despolitizado. 
Sublimação, pode ser traduzida em processos psicanalíticos como uma maneira de transformar algo difícil de aceitar em algo fantasioso, mais aceitável ou palatável. Algo 'sublime' ou sublimado.
Sublimação em física é a passagem do estado sólido diretamente para o estado gasoso, sem passar pelo estado líquido, ou vice versa ao contrário.

Nossa construção do entendimento da ‘despolitização'  começa a se delinear, atentando para a  importância do questionamento. 
Ao não aceitar nada como inquestionável,  passo a questionar o próprio poder.
O sociólogo Chico de Oliveira, comparando a semelhança na atuação dos atuais partidos brasileiros, usou a expressão 'vanguardas do atraso'. Atraso político, nos métodos, objetivos, coerência, visão do futuro.
Durante a ditadura, o movimento estudantil lutar por mais verbas para educação e saúde ainda podia ser tolerado, assim como operários lutando por melhores salários.
Lutar por liberdade de organização e de expressão, pelo voto direto para presidente da república, contra a repressão, por anistia, era vedado durante a ditadura militar.
Qualquer movimento neste sentido era imediatamente rotulado de político. Qualquer movimento político provocava forte repressão.

Convém afastar o pensamento elitista que associa o cidadão politizado ao cidadão letrado, culto ou mesmo acadêmico. Nada mais falso. 
Embora a despolitização prolifere onde falta informação e sobretudo falha a educação, frequentemente vemos até mesmo  políticos e intelectuais ou mesmo acadêmicos pensando e atuando de forma despolitizada.

Se não se posicionam livres para pensar por si mesmos,  podem praticar a despolitização, como se fosse a própria expressão da verdade inquestionável.

Por outro lado,  a participação política,  as lutas sociais,  os debates, os diferentes processos políticos formam cidadãos politizados, conscientes, atuantes, capazes de ações transformadoras da sociedade

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