sexta-feira, 11 de julho de 2014

OS CEGOS DE BRUEGHEL




Arthur Dapieve
A parábola

A parábola

O autoengano se desdobrava no discurso ‘não tem ninguém jogando bem nessa Copa’

Do ponto de vista de um pessimista, os quatro dias que separaram a vitória suada sobre a Colômbia do banho de bola tomado da Alemanha foram intrigantes. Cheguei a folhear as páginas políticas de edições antigas do jornal procurando em vão o anúncio de lançamento do programa “Meu Prozac, minha vida” pelo governo federal.
Eu só podia ter perdido a distribuição de alguma balinha. Jogaríamos a semifinal sem o nosso único craque, Neymar, quebrado, e sem um de nossos dois bons zagueiros, Thiago Silva, suspenso por tolice. Continuávamos jogando mal quase o tempo inteiro. Mas toda enquete, fosse com celebridades, fosse com anônimos, trazia brasileiros cheios de otimismo. Sem Neymar, e por Neymar, o Brasil se superaria, era o mantra.
Lembrei-me, então, de uma entrevista de Carlos Heitor Cony há alguns anos. Perguntaram-lhe por que ele era um pessimista. “Otimismo é má informação”, retrucou. Bingo. Não era Prozac, era desinformação. Porque não havia dez minutos consecutivos de bom futebol nos cinco jogos anteriores que autorizassem a crença na vitória do Brasil sobre a Alemanha. Na verdade, era provável uma derrota feia (ok, não uma horrorosa).
No entanto, o brasileiro acreditava, o brasileiro não desistia nunca, o brasileiro era especialista em superação — o alemão, que perdeu duas guerras mundiais e ergueu um país, claro que não... Enfim, toda sorte de besteirada patriótica que surge nessas horas. Mesmo comentaristas esportivos sérios diziam que o substituto de Neymar poderia se revelar um novo Amarildo, o craque que rendeu o contundido Pelé em 1962.
É óbvio que esse reserva jamais poderia se revelar um novo Amarildo. Primeiro, como bem lembraram o Verissimo e o Calazans, quem “acumulou” Pelé foi Garrincha. O que o Possesso fez foi entrar no vaga de Pelé. Segundo, Amarildo era Amarildo. Não era Bernard, William, Hernanes ou Paulinho, nossas “muitas opções”, como ouvi.
Se isso já não fosse diferença bastante, pensava eu, Amarildo jogou cercado por outros craques. Além de Garrincha, lá estavam Gilmar, Djalma Santos, Mauro, Zózimo, Nilton Santos, Zito, Didi, Vavá e Zagallo. Compare com a safra 2014, de Júlio César, Maicon, David Luiz, Dante, Marcelo, Luiz Gustavo, Fernandinho, Oscar, Hulk e Fred.
O autoengano se desdobrava no discurso “não tem ninguém jogando bem nessa Copa”. Para afirmar isso, precisava-se fingir que Alemanha, Holanda e Argentina, os outros três semifinalistas, já não vinham se apresentando muito melhor do que o Brasil. Precisava-se desligar a TV para não ver Colômbia, França, Bélgica e até Costa Rica.
Definida a semifinal, houve otimista que se apegasse ao drama da Alemanha para eliminar a Argélia na prorrogação. Ora, isso não depunha contra os alemães, mas a favor dos argelinos. Sim, eles também jogaram muito melhor do que nós nesta Copa. Tinham jogadores hábeis, esquema definido, frieza e paixão nas horas certas.
Não é apenas o futebol brasileiro que terá de repensar seus conceitos depois dessa hecatombe. A imprensa brasileira deve se questionar se precisa mesmo assumir o papel de animadora de torcida quando tanto otimismo é contrário aos fatos, criando expectativas com alta probabilidade de serem frustradas. Talvez doesse menos. O papel da imprensa é tocar a real, em todos os campos. Por que no de futebol seria diferente?
Tenho certeza, porém, de que muitos dos que se manifestaram publicamente otimistas estavam intimamente pessimistas. É tão difícil sair do armário dos pessimistas quanto sair do armário dos ateus (caso nunca tenha ficado claro, sou pessimista e ateu). Há uma “criminalização” social do pessimismo, assim como da tristeza. Há a ideia de que o pessimismo paralisa enquanto o otimismo move montanhas. Bem, pode-se pensar o contrário... Como vai tudo às mil maravilhas, o otimista acredita que se a gente melhorar, estraga. É por isso que os governantes detestam os pessimistas.
A coluna da semana passada narrava o mal-estar que me tomou ao me dar conta de que, no meio do jogo com o Chile, eu estava torcendo para que acabasse a agonia da seleção brasileira. Eu não queria mais ver a minha velha e querida amiga da camisa amarela sofrendo daquele jeito. Queria desligar os aparelhos. Disse ainda que, das 12 seleções brasileiras que vi atuar em Copas desde 1970, a atual era a mais desarticulada, trêmula e fosca, com exceção da treinada por Lazaroni em 1990. Eu estava enganado.
Não é preciso ser um otimista para imaginar que alguns jovens atletas podem ser resgatados com vida do combinado Felipão-Parreira e nos representar dignamente em 2018. Aliás, quem diria, a gente tem que agradecer a Zuñiga por tirar Neymar da Copa. Ele não esteve nos melhores dias, mas não carregará essa fratura exposta nas costas.
Os otimistas deveriam ao menos ter desconfiado da semelhança da entrada dos brasileiros em campo com a pintura de Brueghel, o Velho, para a parábola bíblica dos cegos guiando cegos.


domingo, 6 de julho de 2014

JOÃO DONATO EM SEUS 8O

COMPARTILHANDO E HOMENAGEANDO ESTE GRANDE ARTISTA BRASILEIRO - JOVEM DE 80 ANOS...

A Paz 

JOÃO DONATO E 

Gilberto Gil

A paz invadiu o meu coração
De repente, me encheu de paz
Como se o vento de um tufão
Arrancasse meus pés do chão
Onde eu já não me enterro mais
A paz fez um mar da revolução
Invadir meu destino; A paz
Como aquela grande explosão
Uma bomba sobre o Japão
Fez nascer o Japão da paz
Eu pensei em mim
Eu pensei em ti
Eu chorei por nós
Que contradição
Só a guerra faz
Nosso amor em paz
Eu vim
Vim parar na beira do cais
Onde a estrada chegou ao fim
Onde o fim da tarde é lilás
Onde o mar arrebenta em mim
O lamento de tantos "ais"

sábado, 5 de julho de 2014

TODO MUNDO E NINGUÉM





 

Compartilhando literatura portuguesa: -Gil Vicente-AUTO DA BARCA DO INFERNO

Representada pela primeira vez em 1532, como parte de uma peça maior, chamada AUTO LUSITÂNIA (no século XVI, chama-se auto ao drama ou comédia teatral), a obra é de autoria do criador do teatro português, GIL VECENTE.


Entra Todo o Mundo, rico mercador, e faz que anda buscando alguma cousa que perdeu; e logo após, um homem, vestido como pobre.Este chama Ninguem e diz:

Ninguém : Que andas tua aí buscando?

Todo o mundo: Mil cousas ando a buscar :
delas não posso achar,
porém ando porfiano
por quão bom é porfiar.

Ninguém : Como hás nome, cavalheiro?

Todo o Mundo: Eu hei nome Todo Mundo
e meu tempo todo inteiro
sempre é buscar dinheiro
e sempre nisto me fundo

Ninguém: Eu hei nome Ninguém,
e busco a consciência

Belzebu : Esta é boa experiência:
Dinato, escreve isto bem.

Dinato : Que escreverei , companheiro ?

Belzebu : Que ninguém busca consciência,
e todo mundo dinheiro.

Ninguém : E agora que buscas lá?

Todo o mundo : Busco honra muito grande.

Ninguém : E eu virtude, que Deus mande
que tope com ela já.

Belzebu : Outra adição nos acude:
escreve logo aí, a fundo
que busca honra todo mundo
e ninguém busca virtude.

Ninguém : Buscas outro mor bem qu'esse?

Todo o mundo: Busco mais que me louvasse
tudo quanto eu fizesse.

Ninguém : E eu quem me repreendesse
em cada cousa que errasse.

Belzebu : Escreve mais.

Dinato : Que tens sabido?

Belzebu: Que quer em extremo grado
todo o mundo ser louvado,
e ninguém ser repreendido.

Ninguém: Buscas mais, amigo meu ?

Todo o mundo: busco a vida a quem ma dê.

Ninguém : A vida não sei o que é,
a morte conheço eu.

Belzebu : Escreve lá outra sorte.

Dinato : Que sorte?

Belzebu: Muito garrida:
Todo o Mundo busca a vida
e ninguém conhece a morte.

Todo o Mundo: E mais queria o paraíso,
sem mo ninguém estorvar.

Ninguém : E eu ponho-me a pagar
quanto devo para isso.

Belzebu : Escreve com muito aviso.

Dinato : Que escreverei ?

Belzebu: Escreve
que todo o mundo quer o paraiso
e ninguém paga o que deve.

Todo o Mundo: Folgo muito d'enganar,
e mentir nasceu comigo.

Ninguém: Eu sempre verdade digo
sem nunca me desviar

Bellzebu: Ora escreve lá, compadre,
não não sejas tu preguiçoso.

Dinato: Quê?

Belzebu: Que todo o mundo é mentiroso,
E ninguém diz a verdade.

Ninguém: Que mais buscas?

Todo Mundo: Lisonjear.

Ninguém: Eu sou todo desengano.

Belzebu: Escreve, ande lá mano.

Dinato : Que me mandas assentar?

Belzebu: Põe aì mui declarado,
Não te fique no tinteiro:
Todo o mundo é lisonjeiro,
e ninguém desenganado.


SONATA PATÉTICA

 Sonata Patética  Cassiano Ricardo Como na música de Gil "Lá em Londres querendo ouvir Cely Campelo prá não cair naquela ausência,  naq...